quarta-feira, 26 de setembro de 2007

As âncoras de almadrava


São milhares de âncoras imensas, arrumadinhas no porto. Os pesqueiros levam 20, 25 cada vez q saem. Quando fisgam o albacora, amarram com uma ou duas dessas âncoras de 100 quilos cada, deixam uma bóia de arinque e vão embora atrás de mais. Na volta, 2 ou 3 dias dpois, o albacora já cansou e os pescadores conseguem embarcá-lo, junto com as âncoras, q voltam para o pátio do porto com cheiro de craca.

terça-feira, 24 de julho de 2007

4 de julho




Quando clareou, já avistamos nosso último porto. Estamos tão contentes de chegar q até tomamos banho e colocamos roupa de gala, limpinha. Depois de uma atracação bem assistida (deus lhes pague) amarramos o cat intacto em sua própria vaga. Missão cumprida. Agora q a viagem chega ao fim, tenho muito q agradecer aos queridos amigos Marcelo e Maura, pelo convite tão carinhoso, pela viagem maravilhosa e pela boa disposição até o final. Fica tb a minha admiração pela coragem, pela valentia e pela boa vontade em todos os momentos; além da torcida para que Lo Tengo Todo possa melhorar e aproveitar esse barco tão lindo, q veio sobrando naquele mar.

O Mediterrâneo


Depois de atravessar o mar e passar o Estreito, queremos chegar logo. Já está decidido q ñ podemos parar em Ibiza. Vamos direto para a Marina, para entregar o barco a seu dono. A lua cheia nasce amarela, como se explodisse no mar. Ouvimos a previsão de uma baixa com centro em Menorca e começamos a sentir o vento aumentar em frente ao Rio Ebro. É um vento famoso, típico do Mediterrâneo, q até o pai da Má já temia, nos idos de quando pescava no Cantábrico. Nossa última noite foi tb a de mais vento. Passamos surfando pelo canal de Ibiza, dois dias antes de um imenso derramamento de óleo, q interditou todas as praias em plena temporada.

Gibraltar, o Penhasco Inóspito


Enclave britânico em terras mouras, onde a Europa se estica, como se quisesse tocar a Mãe África.

segunda-feira, 23 de julho de 2007

1 de julho



Amanhece um domingo de sol, sentamos para o café, mas o Capitão liga os motores e desamarra. São 20nm a Tarifa, na entrada do Estreito de Gibraltar. A previsão indica vento W, F3 ou 4. Vamos com a grande no primeiro rizo e a genoa aberta. Logo o vento vai para F5 e temos q fechar mais um rizo na grande e enrolar metade da genoa. Ao avistarmos o penhasco, temos uma corrente de 2kts de popa e vento W F6. O Capitão pede para fecharmos a genoa e liga os 2 motores ao mm tempo, é um momento solene. Vamos para dentro do Mediterrâneo! O mar está cheio de carneirinhos brancos. O Marcelo quer colocar o terceiro rizo na grande, mas a tala engancha no estai de BE e a vela não desce. Sou convidada para minha primeira visita ao mastro. O penhasco cresce, lindo, de pedra em contraste com o céu azul, sem nuvens. Querem q eu suba a vela para o Ricardo puxar lá da popa e assim, ver se a tala desengancha. Se soltar, tenho q desadriçar rápido para a vela descer antes de enganchar de novo, com esse ventinho de popa. “Está batendo 40kts!”, avisa o Marcelo com emoção, o q dá um toque de Hollywood à manobra. Não sei qual é a adriça da grande, mm depois de 9 dias a bordo, mas o Ricardo indica q é o branco. A manicaca está bem à mão, no mastro. Não sou nada boa para adriçar velas, mas recebo gritos de incentivo: “vai, muié, força nesse braço!” “Mais energia, tem q comer mais feijão!” Na primeira tentativa, a vela voltou a enganchar antes de descer, mas na segunda, fomos bem sucedidos: a tala desenganchou e colocamos o terceiro rizo, já de cara com o penhasco. Com vento e corrente empurrando, nosso SOG bate o recorde de 10.5kts, o cat se encontra a si mm e festeja. Passamos rápido pelas ruínas de Hércules a BB e os predinhos de Tânger a BE. A África está logo ali. Não podemos nos aproximar de terra pq pode ser perigoso para o barco, mas tb não devemos nos afastar muito, para não entrar no corredor dos navios. Apesar dos perigos, vou pegar a câmera para não perder este momento raro, em que a Europa quase se encosta na Mãe África. O Estreito tem só 10nm e logo, o penhasco fica na popa. O vento continua firme e abrimos meia genoa para aproveitar o impulso, ainda com a grande toda rizada. Apagamos os motores e o barco navega em silêncio.

30 de junho


Saímos para beber. Na viagem, fica claro q o uso (e abuso) do álcool é bem aceito e até estimulado nestes países onde predomina a fé católica. Em muitos círculos sociais, embebedar-se é sinônimo de divertir-se.

29 de junho


Às 15:00hrs, entramos na Marina de Barbate. Pegamos uma vaga ao lado do LePardy q estava em Horta, de uma família de Toronto. Teremos q esperar 2 ou 3 dias aqui. No domingo, deve entrar vento W, q eles chamam de Poniente. Barbate no primeiro dia das férias de verão ferve, tem supermercado, internet e restaurante. É um balneário comparável, talvez, a Praia Grande no litoral sul de São Paulo, onde milhares de famílias espanholas passam as férias de verão. A Marina é ali mm, bem na cidade, ao lado do porto pesqueiro, maravilhoso. Aqui predomina a pesca do albacora (atum), um bicho gigante, de 400, 500 quilos... Eles amarram a isca com umas âncoras imensas, levam umas 20 na coberta, quando saem para trabalhar. Chama-se almadrava essa técnica de pesca. Apesar das paisagens tão lindas, da lua cheia novamente e dos belos pesqueiros, minha melhor lembrança de Barbate foi voltar a comer peixe. Numa travessia assim, é preciso adaptar-se, mas ao chegar em terra, voltamos correndo aos velhos hábitos.

28 de junho


Com os 2 motores e os 2 pilotos funcionando, a tripulação descansada e bem alimentada, navegamos o dia todo com vento fraco e mar calmo. À noite, a previsão anunciou Levante no Estreito, de 25kts. Não podemos atravessar assim, teremos q esperar.

domingo, 8 de julho de 2007

28 de junho


O Ricardo me acordou às 05:45, com o dia clareando, molhado de sal, contente, com o cabo na mão, desenroscado do leme e da rabeta, pronto para a ave maria da manhã. Aproveitamos a ancoragem para fazer um café completo, na mesa, com frutas, cereais, café com leite, pão quente, manteiga e queijo. O Marcelo ressuscitou o 7mil, assim damos uma folga ao 6mil, q vem trazendo o barco sozinho há muitos dias. Saímos motorando pela Baía de Lagos. Este delivery acaba de se transformar em charter turístico pela costa sul de Portugal, de penhascos vermelhos desenhados pelas ondas e predinhos brancos. Podemos ir lá fora, conseguimos adoçar o cockpit na parada. Reina a paz, os 3 foram dormir lá embaixo nas cabines e, pela primeira vez, deixam o barco na minha mão. Vou desviando das redes, dando um toquinho no 7mil. É incrível q seja o mm mar q nos deu aquela surra ainda ontem, hoje está plácido. Temos 0.7kts de corrente, q nos empurra ao Estreito. Faltam ainda umas 16 horas para a fronteira espanhola. Na novela do rádio de hoje, um veleiro pediu May Day ali fora do Cabo de San Vicente, foi aquele rebuliço no canal 16. A última notícia q ouvimos dava conta d q um navio já estava avistando o veleiro, flutuando, e seus 3 tripulantes na coberta. Depois, ñ soubemos mais nada. As novelas do rádio a bordo ñ são prós como as da Globo: sempre têm “meio”, mas freqüentemente falta o começo, e quase nunca têm fim.

sábado, 7 de julho de 2007

Terra à vista


Depois de dois dias de vento F7, com o barco mergulhando a proa a cada onda, às 19:00 do dia 27, avistamos terra. Todo mundo conhece o sentimento de ver terra dpois de muitos dias no mar, de livros, filmes. O barco está surrado, não podemos ligar o motor de boreste pq enroscou um cabo no hélice, o chão está salgado, a luminária caindo, o teto solto, a tripulação sofrida, com sono, dor no corpo, as ondas altas ainda cobrindo o barco cansado, mas a terra aparece no meio da neblina. É terra mm! O Cabo de São Vicente, tão falado desde o século XVI. É ele! Então, os eletrônicos estavam corretos. Conseguimos trazer o barco até a Europa. Já dá para ver as escarpas, e o farol. É o continente. Olha a Escola de Sagres! O farol acende quando passamos. Há mais de 500 anos, os navegadores partem daqui, cheios de alegria e esperança; e chegam aqui, cansados, molhados e contentes da missão cumprida.
Precisamos parar para desenroscar o cabo do hélice. Entramos na Baía de Lagos, perto de Portimão. Abrigo total, o mar vira piscina. Lentamente, o barco vai parando, somente 6mts embaixo da quilha. Desce a corrente, uma rezinha de nada, e estamos ancorados, em silêncio.

26 de junho


Sinto muito, mas ñ consigo escrever. Com o vento em 25/30kts, o mar levantou e voltei a ser eu mm: divido o tempo entre passar mal, comer alguma coisa e deitar para tentar melhorar. O mar ficou LINDO, porém malvado. A Maura definiu bem, ao dizer: "o mar levantou e você morreu". As ondas vêm pelo costado e cobrem nosso teto, o barco está todo fechado. Os janelões da cozinha chegam a ficar submersos, mas logo a proa levanta e faz escorrer o mar pelos costados. Minha cabeça gira e tenho q me segurar para andar. O espetáculo é grandioso, pena q nem consigo admirar. O cockpit ficou intransitável, com pelo menos um palmo de água salgada, q custa a escoar. Em compensação, nossa singradura alcança 160, um assombro(!). E o cat vai sobrando, com essa cara zangada de Fountaine Pajot.

25 de junho


Apesar das CBs mais pra lá, estou escrevendo no sol. Sei q devo evitar carregar sal para dentro do barco, mas ñ consigo resistir, adoro ficar no cockpit. Estou hipnotizada pelo mar. O Ricardo hoje voltou a exclamar: “Q saudade do Alain!” E dpois fala de mim... Não perco de vista q esta é uma oportunidade única que ganhei, de fazer esta travessia em um barco tão bacana. Hoje cedo, o medidor marcou 20kts de vento verdadeiro, e o barco se mostra feliz, subindo e descendo as ondinhas todo valente. A verdade é q está sobrando barco. Gostaria de nadar neste mar de 3400mts, mas ainda ñ encontrei a chance. Meus olhos se perdem em sonhos fantásticos, quero criar desejo, desassossego q ñ passe nem correndo, nem dormindo.